quarta-feira, 11 de abril de 2012

Soneto de fidelidade

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Vinicius de Moraes


Soneto de fidelidade

De todo, a mi amor estaré atento
Antes, con tal celo, y siempre, y tanto
Que aún delante del mayor encanto
De él se encante más mi pensamiento.

Quiero vivirlo en cada vano instante
Y en su alabanza esparciré mi canto
Reiré mi risa y verteré mi llanto
A su pesar o a su placer radiante

Y así, cuando más tarde me reclame
Tal vez la muerte, angustia de quien vive
Tal vez la soledad, fin de quien ama

Yo me pueda decir del amor (que tuve):
Que no sea inmortal, puesto que es llama
Mas que sea infinito mientras ame.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Eu deveria passar por mim

Deus e Belzebu são um só
A cintilar sobre as cúpulas.
Com eles estão a onça o leão e a loba
Mas também as máquinas de devastar
Que serão aniquiladas depois
De estropiadas dobradas amassadas sobre si
Até suspirarem pela sombra
Até enlouquecerem.

E os poderosos sentindo-se inexpugnáveis
Nas sua cidades de aço
Na sua carne de bronze brilhante
Nos seus obeliscos de ónix
Fazendo sexo com os céus
Capazes de engolir as brasas
Com as suas portas ávidas
Com as suas bocas centro de furacões

Também eles sucumbirão
Com os mares e os meteoros
A erva verde as forragens os manjares insípidos
E as gemas dos dedos

Porque eles são o eco de um uivo e não o sabem
Porque eles são de nada e não o sabem.

Desesperados hão-de deitar o fogo à floresta dos homens
Lançar glaciares contra as labaredas
Mas restar-lhes-ão as cinzas a soluçar na noite
Uma paródia selvagem de negro e negro
Que o Nada lhes saberá explicar.

A todos o incêndio de tudo
Até dos átomos ferozes
Que eternamente se pensaram a devorar
A estrada de leite dos céus
Até os átomos serão traçados
Pelo gládio do Nada sagrado
Até os deuses dez vezes serão cortados
Pela foice em fúria do ceifeiro do tempo.

Henrique Dória. Odisseus (2012)



Yo debería pasar por mí

Dios y Belzebú son uno sólo
Que centellea sobre las cúpulas.
Con ellos están la onza el león y la loba
Mas también las máquinas de devastar
Que serán aniquiladas después
De mutiladas vergadas aplastadas sobre sí
Hasta que suspiren por la sombra
Hasta que enloquezcan.

Y los poderosos sintiéndose inexpugnables
En sus ciudades de acero
En su carne de bronce brilhante
En sus obeliscos de ónice
Copulando con los cielos
Capaces de engullir las brasas
Con sus puertas ávidas
Con sus bocas centro de huracanes

También ellos sucumbirán
Con los mares y los meteoros
La hierba verde los pastos los manjares insípidos
Y las yemas de los dedos

Porque ellos son el eco de un aullido y no lo saben
Porque ellos son de nada y no lo saben.

Desesperados prenderán fuego al bosque de los hombres
Lanzarán glaciares contra las llamaradas
Pero les quedarán las cenizas sollozando en la noche
Una parodia salvaje de negro y negro
Que la Nada les sabrá explicar.

A todos el incendio de todo
Hasta de los átomos feroces
Que eternamente se imaginaron devorando
El camino de leche de los cielos
Hasta los átomos serán corroídos
Por la espada da la Nada sagrada
Hasta los dioses diez veces serán cortados
Por la hoz en furia del segador del tiempo.