sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Autobiografia

Não preciso mas tu sabes como eu sou
Encaminho-me pouco divirto-me assim nas copas
Das árvores soprando pensamentos para o mundo que há de noite.
As pessoas quando acordam são outras, já sabias,
Essa névoa contemporânea do medo miudinho
Que perdemos nas cidades e nos corpos, tu entraste
Antes de mim nos jogos, o enxofre da música e o
Lago do feitiço, inocente homem breve que sonha
Tu bem sabes.
Depois aluguei a bruxa por uma vasta noite.
E a minha vida mudou, a noite cresceu,
A vertigem ardeu-me nos braços até a sangria
Do tédio quando para sempre julguei que te perdia.
Na luta perdi um ou dois braços,
Mais do que o que tinha. Mas esta memória é um palácio,
São corais no pensamento. Jardins e fantasmas,
O gume nas mãos sorvendo, criança estratosférica
E profunda: sem braços e agora sem mais nada.
Não me percebeste, enchi-me de fúria.
É uma arte, queria eu dizer, matar sem retrocesso e
Atraso — ah aqueles braços para apoiar as mãos — ,
Ceifando. Saturno e o vento na proa erguendo.
O:navio:no:mar:parado:parado:completamente.
Parado.como dizer? Não dizer, eu sou.uma vida
Medonha e múltipla. E agora descanso
Deitado nestas mãos que mexem
Sem apoio, sabes, nascendo dos teus olhos
P’la manhã.

Rui Costa. A nuvem prateada das pessoas graves. Edições Quasi (2005)


Autobiografía

No me hace falta pero tú ya sabes cómo soy
Me encarrilo poco me divierto así en las copas
De los árboles soplando pensamientos para el mundo que hay de noche.
Las personas cuando se despiertan son otras, ya lo sabías,
Esa niebla contemporánea del miedo menudo
Que perdemos en las ciudades y en los cuerpos, tú entraste
Antes que yo en los juegos, el azufre de la música y el
Lago del hechizo, inocente hombre breve que sueña
De sobra lo sabes.
Después alquilé a la bruja por una vasta noche.
Y mi vida cambió, la noche creció,
El vértigo me ardió en los brazos hasta la sangría
Del tedio cuando para siempre creí que te perdía.
En la lucha perdí uno o dos brazos,
Más de lo que tenía. Pero este recuerdo es un palacio,
Son corales en el pensamiento. Jardines y fantasmas,
El filo en las manos sorbiendo, niño estratosférico
Y profundo: sin brazos y ahora sin nada más.
No me entendiste, me henchí de furia.
Es un arte, quería yo decir, matar sin retroceso ni
Retraso —ah aquellos brazos para apoyar las manos—,
Segando. Saturno y el viento en la proa levantando.
El:navío:en:el:mar:parado:parado:completamente.
Parado.cómo decirlo? No decir, yo soy.una vida
Temible y múltiple. Y ahora descanso
Acostado en estas manos que se mueven
Sin apoyo, sabes, naciendo de tus ojos
Por la mañana.

1 comentário:

Sun Iou Miou disse...

O funeral do Rui será no cemitério de Santa Marinha coordenadas: 41 07' 43,83''N, 8º 37' 37,64''O) pela 10h30 da manhã do dia 20 de Janeiro. O corpo estará numa das capelas mortuárias do cemitério a partir das 9h00 da manhã do mesmo dia. Após uma breve cerimónia o corpo do Rui seguirá para o cemitério de Macieira de Cambra, Vale de Cambra (coordenadas GPS: 40º 51' 31,39''N, 8º 22' 28,36''O).
Informa António Aguiar Costa, irmão do Rui.