segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

São Leonardo da Galafura

À proa dum navio de penedos,
A navegar num doce mar de mosto,
Capitão no seu posto
De comando,
S. Leonardo vai sulcando
As ondas
Da eternidade,
Sem pressa de chegar ao seu destino.
Ancorado e feliz no cais humano,
É num antecipado desengano
Que ruma em direcção ao cais divino.

Lá não terá socalcos
Nem vinhedos
Na menina dos olhos deslumbrados;
Doiros desaguados
Serão charcos de luz
Envelhecida;
Rasos, todos os montes
Deixarão prolongar os horizontes
Até onde se extinga a cor da vida.

Por isso, é devagar que se aproxima
Da bem-aventurança.
É lentamente que o rabelo avança
Debaixo dos seus pés de marinheiro.
E cada hora a mais que gasta no caminho
É um sorvo a mais de cheiro
A terra e a rosmaninho!

Miguel Torga. Diário IX


São Leonardo da Galafura

En la proa de un navío de peñascos,
Navegando en un dulce mar de mosto,
Capitán en su puesto
De mando,
San Leonardo va surcando
Las olas
De la eternidad,
Sin prisa de llegar a su destino.
Anclado y feliz en el muelle humano,
En un anticipado desengaño
hace rumbo en dirección al muelle divino.

Allí no tendrá bancales
Ni viñedos
En la niña de los ojos deslumbrados;
Dueros desaguados
Serán charcos de luz
Envejecida;
Rasos, todos los montes
Dejarán prolongar los horizontes
hasta donde se extinga el color de la vida.

Por eso, se aproxima despacio
A la bienaventuranza.
Lentamente el rabelo avanza
Debajo de sus pies de marinero.
Y cada hora más que gasta en el camino
Es un sorbo más de olor
¡A tierra y a romero!

Sem comentários: